segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Bébes roubados na China alimentam negócio das adopções


Bébes roubados na China alimentam negócio das adopções
Desde o início dos anos 80, mais de 80 mil crianças chinesas foram adoptadas no estrangeiro, a maioria das quais por famílias dos Estados Unidos. Suspeita-se agora que muitas foram retiradas à força das suas famílias.Por Barbara Demick

O funcionário do planeamento familiar rondava regularmente por aquela aldeia situada no cimo da montanha, à procura de fraldas em estendais de roupa a secar e à escuta de choros de bebés recém-nascidos e com fome. Num dia de Primavera de 2004, apresentou-se à porta da casa de Yang Shuiying e ordenou. "Entreguem o bebé."

Yang chorou e discutiu e argumentou, mas, sozinha com a sua filha de quatro meses de idade, não estava em posição de resistir ao homem que todos os pais de Tianxi temiam.

"Vou vender a bebé para adopção no estrangeiro. Posso conseguir bom dinheiro por ela", disse ele à chorosa mãe antes de se meter no seu automóvel com a criança e se dirigir com ela para um orfanato em Zhenyuan, uma cidade vizinha na província de Guizhou, no Sul da China. Em troca, prometeu que a família não teria que pagar multas por ter violado a política chinesa de se poder ter apenas um filho.

E depois avisou-a: "Não diga nada a ninguém acerca disto." Ao longo de cinco anos ela guardou aquele terrível segredo. "Eu não percebi que eles não tinham o direito de levar os nossos bebés", conta Yang.

Desde o início dos anos 80, mais de 80 mil crianças chinesas foram adoptadas no estrangeiro, a maioria das quais por famílias dos Estados Unidos.

A ideia que se tinha era que os bebés, na sua maioria meninas, eram abandonados pelos seus pais devido à tradicional preferência por filhos do sexo masculino e às restrições ao tamanho das famílias na China. E não há dúvida de que terá sido esse o caso de dezenas de milhares de meninas.

Mas alguns pais estão a chegar-se à frente e a contar histórias dilacerantes de bebés levados através de coacção, fraude ou rapto - por vezes por responsáveis governamentais que disfarçavam as suas pistas fingindo que os bebés tinham sido abandonados. Os pais que afirmam que as suas crianças foram levadas queixam-se de que os funcionários eram movidos pelos 3 mil dólares por criança que os pais adoptivos pagam aos orfanatos.

"Os nossos filhos estão a ser exportados para o estrangeiro como se fossem produtos industriais", diz Yang Libing, um trabalhador migrante da província de Hunan cuja filha foi sequestrada em 2005. Entretanto soube que ela está nos Estados Unidos.

As dúvidas acerca do modo como na China são obtidos os bebés para adopção começaram já a espalhar-se pela comunidade internacional de adopções. "No início, acho eu, a adopção na China era algo muito positivo, porque havia tantas meninas abandonadas. Mas depois tornou-se um mercado orientado pela procura e oferta, e muitas pessoas a nível local estavam a fazer muito dinheiro com o processo", declara Ina Hut, que no mês passado se demitiu do posto de directora da maior agência holandesa de adopção, devido a preocupações sobre tráfico de bebés.

O Centro para os Assuntos de Adopção da China, a agência governamental que supervisiona as adopções a nível interno e internacional, rejeitou repetidos pedidos para comentar estas alegações. Funcionários da agência disseram a diplomatas estrangeiros que acreditam que tais abusos se limitaram a um pequeno número de bebés e que os responsáveis foram demitidos e castigados.

Para os pais adoptivos, a possibilidade de os seus filhos terem sido tirados à força dos pais biológicos é aterrorizadora. "Em 2006, quando adoptámos, encheram-nos a cabeça sempre com as mesmas histórias, que havia milhões de meninas não desejadas na China, que elas seriam deixadas na rua para morrer se não as ajudássemos", conta Cathy Wagner, mãe adoptiva residente na Nova Escócia, Leste do Canadá. "Adoro a minha filha, mas se tivesse tido alguma noção de que o meu dinheiro iria levar a que ela fosse retirada a outra mulher que a adorava, eu nunca a teria adoptado."

O problema tem as suas raízes no controlo de população da China, que limita a maioria das famílias a uma criança, duas se viverem no campo e a primeira for uma rapariga. Cada localidade tem um gabinete de planeamento familiar, habitualmente ocupado por quadros do Partido Comunista com amplos poderes para ordenar abortos e esterilizações. Pessoas que tenham mais filhos podem sofrer multas de até seis vezes os seus rendimentos anuais - multas eufemisticamente denominadas "despesas de serviço social".

"O pessoal do planeamento familiar é na realidade mais poderoso do que o ministro da Segurança Pública", afirma Yang Zhizhu, professor de Direito em Pequim. Ao longo das províncias, cartazes em vermelho exortam "Dê à luz menos bebés, plante mais árvores" e, de um modo mais agoirento, "Se der à luz mais crianças, a sua família ficará arruinada".

Mas a lei não permite que funcionários tirem bebés aos seus pais. Há famílias que afirmam que foram ameaçadas e agredidas, de modo a forçá-las a entregarem as suas filhas. Outras dizem que foram enganadas para prescindirem dos seus direitos parentais.

"Pegaram na bebé e arrastaram-me para fora de casa. Eu gritei - pensei que eles me iam bater", recorda Liu Suzhen, uma frágil mulher da localidade de Huangxin na província de Hunan.

Numa noite de Março de 2004 estava a tomar conta da sua neta de quatro meses quando uma dúzia de funcionários invadiu a sua casa. Diz que levaram-na juntamente com a neta até um gabinete de planeamento familiar, onde um homem lhe agarrou o braço e obrigou-a a colocar a impressão digital num documento que ela não conseguia ler.

Tarde demais

Assim que uma criança é levada para um orfanato, os pais perdem todos os seus direitos. "Nem me deixavam chegar ao pé da porta", recorda Zhou Changqi, um trabalhador da construção civil cuja filha de seis meses foi levada em 2002 por funcionários do planeamento familiar em Guiyang, na província de Hunan. Durante três anos Zhou tentou sistematicamente entrar no Instituto de Segurança Social de Changsha, um dos maiores orfanatos que enviam crianças para o estrangeiro, até que um dia lhe disseram: "É tarde de mais. A sua filha já foi para a América."

Na maior parte da China, os aldeões desde há muito vivem com medo das visitas-surpresas de funcionários do planeamento familiar. Em Tianxi, uma aldeia de 1800 habitantes rodeada de nevoeiro e escondida no alto das verdejantes montanhas perto de Zhenyuan, os funcionários do planeamento familiar chegam a efectuar inspecções duas vezes por semana - não se importando com o facto de que chegar à aldeia implica uma viagem de carro de duas horas através de uma estrada poeirenta e esburacada e depois mais meia hora a subir o monte a pé. Ao longo das décadas de 1980 e 1990, quando as famílias eram demasiado pobres para pagar as multas, os funcionários puniam-nas pilhando as suas casas ou confiscando vacas e porcos, afirmam os moradores.

Mas em 2003 a situação alterou-se. No ano após o Instituto de Segurança Social de Zhenyuan ter sido aprovado para participar num ambicioso programa de adopção no estrangeiro, os funcionários do planeamento familiar deixaram de confiscar animais. Em vez disso, começaram a levar bebés.

"Se as pessoas não conseguiam pagar as multas, eles levavam os bebés delas", conta um empregado municipal de Zhenyuan já reformado que costumava trabalhar para o orfanato como pai de acolhimento.

"Estávamos sempre aterrorizados com eles", diz Yang Shuiying, a mãe de 34 anos cuja filha foi sequestrada.

Em Dezembro de 2003 Yang deu à luz a sua quarta filha. A bebé nasceu em sua casa, com a ajuda de uma parteira. Fora uma gravidez não planeada. De facto, o seu marido tinha-se submetido a uma vasectomia poucos dias antes de ela perceber que iam ter outro filho.

"Não tinha planeado ter outro bebé, mas quando tive percebi que queria ficar com ela e criá-la", conta Yang, uma mulher de voz suave e olhos tristes.

O seu marido, Lu Xiande, sentiu ainda mais intensamente que o lugar da sua nova bebé era em casa. Ele estava no mercado quando a filha foi confiscada, e ficou furioso quando descobriu o que tinha acontecido. "Vou trazê-la de volta", prometeu à sua devastada esposa.

Viajou até à costa oriental da China, na esperança de, como trabalhador migrante, conseguir juntar dinheiro suficiente para pagar a multa do planeamento familiar. Mas Lu adoeceu e teve de voltar para casa. Pouco depois, tentou cortar a garganta com uma faca de talhante.

Quase todos os habitantes de Tianxi conhecem alguém cujo bebé foi levado. Um idoso curvado sobre uma bengala de madeira feita à mão contou como a sua neta foi levada. Outro homem, mais novo, lembrou o caso de uma sua sobrinha.

Os aldeões ofendem-se com a ideia de que alguns deles não gostam das suas filhas e facilmente as abandonam. "As pessoas daqui não abandonam as suas crianças. Não vendem as suas crianças. Sejam meninos ou meninas, são do nosso sangue", afirma Lin Zeji, de 32 anos, um agricultor que alega que a sua terceira filha foi levada em 2004.

Sob a lei chinesa, é exigido aos funcionários que procurem os pais biológicos de bebés abandonados. Quatro meses após a filha de Shuiying ter sido levada, a sua fotografia apareceu numa notícia publicada no "Diário da Cidade de Ghizhou", juntamente com as de outras 14 crianças.

O anúncio afirmava, falsamente, que a bebé fora "encontrada abandonada à porta" de uma casa na aldeia de Tianxi. "Quem vir esta criança deve contactar o orfanato no prazo de 60 dias; em caso contrário, a criança será considerada órfã", lia-se no anúncio de 14 de Agosto de 2004, que os pais nunca viram, dado que o jornal não está disponível na sua remota aldeia.
Muitos dos pais de crianças raptadas são analfabetos e foi-lhes dito pelos funcionários do planeamento familiar que a lei permite a confiscação de bebés, portanto acham que não vale a pena apresentar queixa.

A verdade veio ao de cima quando um professor que tem familiares na aldeia de Tianxi relatou a situação à polícia e a uma agência de regulação. Como não recebia resposta, colocou denúncias na Internet, que chegaram em Julho aos meios de comunicação social chineses. O professor, temendo represálias, tinha-se escondido.

Ainda em Julho, a Embaixada dos Estados Unidos em Pequim emitiu um comunicado referindo fontes da Autoridade Central de Adopção da China, segundo as quais "sete funcionários implicados neste caso foram detidos". O comunicado acrescentava ainda que "os Estados Unidos levam a sério qualquer alegação de que crianças terão sido colocadas para adopção em outros países sem consentimento ou conhecimento por parte dos pais".

Mas em Zhenyuan os funcionários negaram que alguém tenha sido preso ou despedido. Afirmam que os castigos variaram entre advertências e retirada de pontos por demérito. Shi Guangying, o funcionário que levou a bebé de Yang, foi despromovido.

Onde está o dinheiro?

Os funcionários de Zhenyuan defendem a sua actuação. "É mentira que eles levaram bebés sem o consentimento dos pais deles. Isso é impossível", declara Peng Qiuping, quadro do Partido Comunista e director de propaganda em Zhenyuan. "Esses pais concordaram em que as crianças deveriam ser colocadas para adopção. Perceberam que tinham sido gananciosos e que tinham tido mais filhos do que aqueles que podiam sustentar." Diz Wu Benhua, director do gabinete de assuntos sociais: "Elas estão melhor com os pais adoptivos do que com os pais biológicos."

Entre 2003 e 2007, o orfanato de Zhenyuan enviou 60 bebés para os Estados Unidos e para a Europa. Wu avança que o dinheiro recebido dos pais adoptivos, 180 mil dólares no total, se destinou a fornecer alimentação, vestuário, camas e assistência médica para os bebés e para melhorar as condições no Instituto de Segurança Social.

Mas, antes da adopção, a maioria dos bebés ficava com famílias a que pagavam 30 dólares [ por mês pelos seus serviços, de acordo com as declarações de um desses pais de acolhimento. Não se notou qualquer sinal evidente de recuperação do instituto, um sombrio edifício de três andares com janelas tapadas. Não é permitida a entrada de jornalistas. "Não sabemos o que aconteceu ao dinheiro, e não nos atrevemos a perguntar", explica Yang Zhenping, um fazendeiro de 50 anos da zona de Tianxi.

Brian Stuy, um pai adoptivo de Salt Lake City (no estado do Utah, EUA) que investiga as origens de chineses adoptados, notou que um invulgar número de bebés mais velhos era referido como sendo de abandonados. Ele suspeita que se trata de bebés que foram confiscados, roubados ou entregues sob coacção. "Quem não quer uma menina entrega-a imediatamente após ela nascer", conta Stuy.

E acredita que os 3 mil dólares da taxa de adopção - cerca de seis vezes o rendimento anual na China rural - terá levado a alguns abusos. "É a adopção internacional que está a causar este ambiente que leva famílias a planear entregar as crianças para conseguir dinheiro", avança Stuy. "Se não houvesse adopção internacional e se o Estado tivesse que criar os miúdos até que eles fizessem 18 anos, pode ter a certeza de que o planeamento familiar não os confiscaria."

Em Filadélfia, estado da Pensilvânia, Wendy Mailman, que em 2005 adoptou uma menina do mesmo orfanato em Zhenyuan que recebeu bebés confiscados, agora questiona tudo o que lhe disseram acerca da bebé que os funcionários do orfanato afirmam ter nascido em Setembro e abandonada em Janeiro. "Por que razão uma mãe que não queria a sua bebé seria tão insensível ao ponto de esperar até ao pior do Inverno para a abandonar?", pergunta.

Wendy pensa no que faria se descobrisse que a sua filha era uma das bebés roubadas. Sabe que nunca poderia devolver a menina de seis anos já americanizada. Mas, continua, "certamente gostaria de dizer à família biológica que a filha deles está viva e feliz e talvez enviar-lhes uma fotografia. Construir uma relação com eles mais tarde seria uma decisão da minha filha".

Para muitas famílias biológicas, isso seria suficiente. "Nunca a obrigaríamos a voltar, porque uma miúda criada no Ocidente não quereria viver numa aldeia pobre como esta", diz Yang Jinxiu, sogra de Yang Shuiying. "Mas gostávamos de saber onde ela está. Gostávamos de ver uma fotografia. E gostávamos que ela soubesse que sentimos saudades dela e que não a rejeitámos."
Com Nicole Liu e Angelina Qu, em Pequim
Exclusivo PÚBLICO/"Los Angeles Times"

E o país ficou assim...

Resultados Globais
Votos
Partido % Votos
Votos Mandatos
PS 36.56% 2068665 96
PPD/PSD 29.09% 1646097 78
CDS-PP 10.46% 592064 21
BE 9.85% 557109 16
PCP-PEV 7.88% 446174 15
PCTP/MRPP 0.93% 52633 0
MEP 0.45% 25338 0
PND 0.38% 21380 0
MMS 0.29% 16580 0
PPM 0.27% 14997 0
MPT-PH 0.21% 12025 0
PNR 0.21% 11614 0
PPV 0.15% 8485 0
PTP 0.08% 4789 0
POUS 0.08% 4320 0
MPT 0.06% 3241 0

Mais tarde, depois de respirar bem fundo, darei a minha visão do futuro próximo do nosso país.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Marcello/Bach: Adagio BWV 974 (G. Gould)



Para entrar no espírito do Outono, nada melhor que este Adagio de Bach, interpretado por Glenn Gould.

Uma tarde no Conservatório - Escola das Artes

Eis o relato de um pai que, literalmente, perdeu uma tarde no Conservatório a escollher horário para as aulas de Iniciação Musical II e Piano com a terrível tarefa de conciliar com os horários da Escola e tentando não sobrecarregar as tarefas e horários da sua menina mais velha.
Diálogo entre mim e a funcionária:
Eu: Boa tarde, onde são as inscrições para Iniciação Musical?
Funcionária: São por aqui, tem de estar atento porque começam às 16horas!
Eu: Sim, mas por aqui onde concretamente!?
Funcionária: Já lhe disse nesta zona!
Ok, respirei fundo e fui pregar para outra freguesia. Eis que olho, por acaso, para uma porta e está o nome da professora de IM da minha filha no ano passado, faço-me de tonto e pergunto-lhe se é ali que inscrevo a petiz, muito simpática a senhora diz-me que é no 2º andar. Chego a cima e corre uma folha de papel para organizar a ordem de chegada (nada português, pensei eu!!!), às 15.25 horas era já o 16º inscrito, encontro-me com uma amiga e vamos à caça da Professora de Piano e caçamo-la, horários fixados para as aulas de piano e toca de subir para a Iniciação Musical entro na sala para escolha de horário às 16.40 horas e, finalmente, escolho o horário de IM, desço para falar novamente com a Prof. de Piano tudo acertado, então adeus até dia 6 de Outubro. Vamos para o bar lanchar tentar conciliar tomas/largadas de miúdas para o Conservatório quem fica com quem, quem vai buscar quem tudo acertado e já são 17.40 hrs ala que se faz tarde para ir buscar a mais nova, uma estafa. Já mais morto que vivo o membro masculino do clã vê a prol toda reunida por volta das 18.40 hrs, banhos, jantares, episódio da Docinho de Morango e conto, xixi/cama. Respiro fundo, e o jantar sonhado/ansiado está finalmente servido, o que só aconteceu às 20.55.
Moral: Se os filhos soubessem o que fazemos por eles todos os dias portavam-se bem, sem birras nem reclamações, mas como dizia o outro é a vida!!!

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Balanço do 1º dia de aulas

Eu: "Então que tal a escola?"
Ela: "Foi boa,papá, gostei, a professora é simpática."
Moral da história: Todo o meu nervosismo (ansiedade) e mau humor do fim de semana desapareceu num ápice. Que bom, sinto-me feliz por ela ter gostado da professora, dos colegas (disse-nos que já fez um amigo novo o que é sempre bom), espero que assim continue.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

1º dia de aulas



Hoje fui pôr a minha filha mais "velha" à escola (1ª classe) e sinto-me assim tal qual descreve a letra desta música, sinto que vivo momentos de "emoções fortes" e elas (filhas) continuam a crescer a uma velocidade alucinante. Há momentos na vida que julgamos que os filhos devem crescer depressa para não nos "chatearem", mas na hora H, como esta que vivo, sinto um turbilhão de emoções que preferia metê-la numa redoma para a proteger do desconhecido, da competição que agora começa e só terminará no fim da sua vida, vamos ver como se saí desta tarefa (o papá crê que bem!!!. E pensar que tenho de passar por esta provação mais duas vezes é dose (oxalá o coração aguente).

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

A gestão do pessoal

A gestão do pessoal
Helena Matos
Não temos Ministério da Educação, mas um ministério que coloca os seus funcionários. Um dos melhores retratos da educação em Portugal é aquele que foi traçado nos recentes debates entre os líderes partidários. Os candidatos falaram sobre avaliação de professores, mas não sobre o ensino. Na verdade, em Portugal há muito que a educação se resume a uma questão laboral. Não temos propriamente Ministério da Educação, mas sim um ministério que coloca e gere as carreiras dos seus funcionários. E o próprio destino dos ministros da Educação é ditado não pelo que faz pela qualidade do ensino, mas sim sobre a relação que estabelece com os sindicatos do sector. Que me recorde, e acompanho este assunto com alguma regularidade, a única questão pedagógica que politicamente se discutiu nos últimos tempos versava os conteúdos da Educação Sexual. Sobre o Português e a Matemática, o Inglês e a História só se fala a propósito dos resultados nos exames nacionais. A Filosofia e a Física têm qualquer dia tantos alunos quantos linces existem na Malcata. Da reforma gramatical iniciada com extraordinária leviandade e assinalável ignorância há cinco anos não se sabe onde pára... Mas nada disto parece ser suficientemente importante para que seja incluído nos debates destas legislativas na temática da educação. É bizarro que o Estado português gaste em média cinco mil euros por ano com cada aluno no ensino dito gratuito, que os os exames revelem que estes mesmos alunos estão progressivamente a aprender menos, que tenhamos problemas graves de indisciplina em muitas escolas e que aquilo de que se fala quando se fala de educação seja do sistema de avaliação dos professores. E é muito preocupante que as lideranças partidárias estejam elas mesmas reféns dessa perversão que reduziu o ensino aos problemas laborais dos professores. Há que fazer uma total inversão das prioridades nesta matéria. A escola tem de ter no centro os alunos. Os professores, os edifícios, os funcionários só existem porque existem alunos. E esses alunos, até esclarecimento mais cabal, estão na escola para aprender, embora levem grande parte do tempo lectivo ocupados com umas disciplinas de nomes pomposos (como Estudo Acompanhado ou Formação Cívica) e conteúdo nulo.Aliás, só a distância entre aquilo que os líderes partidários entendem ser a educação e aquilo que ela realmente é explica que, apesar dos debates terem acontecido em Setembro, mês do início das aulas, uma despesa como a dos manuais escolares não lhes tenha merecido grande atenção. Contudo, cada família gasta anualmente 150 a 200 euros, por criança, com os manuais que vão do 5.º ao 9.º anos, um valor muito superior ao das taxas moderadoras na saúde, assunto que os candidatos tanto apreciam discutir. E quando de alguma forma a temática dos manuais escolares é abordada, restringe-se inevitavelmente à questão daqueles que antes se chamavam pobres, depois carenciados, em seguida desfavorecidos e que agora creio serem definidos como tendo menores rendimentos, mas que, mais cruamente falando, são aqueles que não têm dinheiro para pagar os ditos manuais. Como é óbvio, o prémio da bondade nesta matéria vai para aqueles que reivindicam manuais gratuitos para todos ou, por outras palavras, defendem que os manuais ditos gratuitos sejam pagos através dos impostos, pois o gratuito infelizmente não existe. Mas antes de passarmos o cheque, seja como contribuintes ou compradores, cabe perguntar: para quê tanto manual? Muitos deles, na verdade, não fazem falta alguma. Por exemplo, durante quanto tempo vamos ter de comprar manuais de Educação Física? Noutros casos as aulas são cada vez menos aulas e mais um papaguear autista dos manuais. E por fim temos uma questão incontornável: por que terão os manuais escolares de ter uma vida útil de dez meses? É espantoso que o correio electrónico nos interpele sobre a necessidade de imprimirmos isto ou aquilo e depois, todos os anos, assistimos impávidos a este desperdício de papel e dinheiro, como se ele fosse uma fatalidade. Bastaria que, no final do ano lectivo, se entregassem nas escolas os manuais usados, se seleccionassem os que poderiam ser usados de novo e no início do ano lectivo seguinte certamente que os alunos teriam de comprar novos manuais, mas não para todas as disciplinas.A redução da escola a um espaço do qual os políticos apenas debatem a conflitualidade laboral e quando muito as questões do gratuito leva ainda a que tenha passado quase sem referência a degradação da escola pública enquanto instituição que, a par do serviço militar obrigatório, tinha o mérito de colocar, lado a lado, os filhos dos portugueses, independentemente dos rendimentos, habilitações e estatuto das respectivas famílias. Testemunhos mais ou menos avulsos dão conta de que uma das consequências da presente crise é o regresso de alguns filhos da classe média ao ensino público. Talvez a integração destes alunos e a presença das respectivas famílias sirva para questionar muito do folclore e da falta de autoridade que por lá se fazem sentir, sobretudo até ao 9.º ano. E naturalmente também para confrontar a classe política com o paradoxo que resulta de os portugueses serem suficientemente adultos para pagar impostos e para perceberem a importância da escolaridade obrigatória. Já na hora de decidirem qual escola, pública ou privada, desejam que os seus filhos frequentem, passam a irresponsáveis e o Estado português decide que os seus filhos só podem frequentar a escola pública da sua área de residência. Quando poderemos discutir a possibilidade de o Estado entregar à escola pública ou privada escolhida pelas famílias a verba que vai gastar com a escolaridade obrigatória dessas crianças? Tudo isto é demasiado importante e demasiado caro para que fique restringido no debate político à relação que o ministro oficial, o primeiro-ministro e os candidatos a sê-lo têm ou pensam vir a ter com o ministro-sombra, a saber Mário Nogueira, sobre o omnipresente assunto da gestão do pessoal. Jornalista