quinta-feira, 7 de maio de 2009

A jornada de luta da mulher da esfregona - Helena Matos (Público)


Os sindicatos são noticiados com paternalismo e só quando os amigos de ontem se tornam ministros é que o verniz estala

No mesmo dia 2 de Maio em que a imprensa dava grande destaque às agressões de que Vital Moreira fora alvo na manifestação convocada pela CGTP sabia-se que um dos sindicatos filiados na mesma central sindical, o Sinttav, despedira a sua única funcionária da limpeza. O argumento invocado foi a extinção do posto de trabalho. Acontece que na delegação do Porto do Sinttav, onde trabalhava a funcionária despedida, ela era a única a exercer essa função, logo rapidamente se percebe que algo não bate certo nesta história. E, se recuarmos alguns dias, ainda os cravos estavam vermelhos nas lapelas daqueles que os usaram neste Abril, quando se soube que três dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos (Sitava), que também são militantes do PCP, estavam a ser alvo de inquéritos internos instaurados pelo partido, por não terem apoiado a lista B nas eleições do Sitava.Destes casos infelizmente pouco se fala, pois, ao contrário do que sucedeu com Vital Moreira, o repórter não só nunca está lá, como raramente lá procura estar. Os sindicatos são noticiados regra geral com paternalismo e apenas quando os amigos de ontem se tornam nos ministros de hoje é que o verniz estala, como aconteceu quando este Governo revelou quanto custavam os delegados sindicais nos CTT ou no Ministério da Educação. Fora isso, as notícias sobre os sindicatos são apenas uma reprodução dos seus comunicados. E isto é válido para o despedimento da mulher da esfregona em 2009 ou dos jornalistas em 1990.Para os anais da dificuldade que os jornalistas portugueses têm em noticiar o que acontece nesse universo que vai do PCP aos sindicatos (e agora também às franjas do BE, mas isso não é o assunto desta crónica) ficará sempre o caso do fecho do jornal O Diário, afecto ao PCP, em Junho de 1990. Tal como acontece a muitas empresas que hoje fecham as suas portas, também O Diário recebera subsídios vários, mas nem assim se impediu o fecho. Ao reler as páginas de 1990 percebe-se o embaraço gerado pelo caso de O Diário, tanto mais que os despedimentos foram feitos ao abrigo duma legislação que o PCP e os sindicatos que lhe eram afectos contestavam com veemência.Em 2009, quando se vê, por exemplo, gente a salivar com os sequestros de gestores efectuados pelos sindicatos franceses ou se tenta desculpar a agressão a Vital Moreira com a crise, convirá que se perceba que os sindicatos, tal como acontece com os representantes doutros interesses, precisam de ser noticiados sem as habituais condescendências. Tanto mais que os sindicatos, tal como a democracia, podem ser péssimos, mas ainda não se arranjou nada melhor para os substituir. a Ditoso livro que tais vendas tem. É um remake: a cadeia de supermercados Jumbo tornou mais uma vez pública a decisão de não vender um livro, concretamente A Casa dos Budas Ditosos, de João Ubaldo Ribeiro, e logo surgiram catadupas de indignação com o que rapidamente é definido como censura. Nunca percebi esta fixação do grupo Auchan na alegada pornografia do livro em questão, mas menos percebo ainda o espalhafato indignado que o caso tem merecido e que nada tem a ver com censura. Quem frequenta supermercados, do grupo Auchan ou doutro qualquer, e procura mais que livros de auto-ajuda, guias de viagens e romances históricos com dragões e raios ofuscantes na capa percebe rapidamente que existem milhares de títulos que nunca foram comercializados nos mesmos supermercados. A falar verdade, alguns títulos nem sei se chegam a ser vendidos nas livrarias, pois actualmente o tempo de vida de um livro numa livraria consegue ser inferior ao de um iogurte num supermercado.Quanto a Nélson de Matos, o editor em Portugal de A Casa dos Budas Ditosos, embora publicamente defina esta decisão do grupo Auchan como um "acto inamistoso", certamente que já ouviu falar de publicidade gratuita e também sabe que os supermercados não vendem tudo o que é editado, tal como os editores não publicam tudo o que lhes põem à frente. Os únicos que realmente se podem indignar são os accionistas do grupo Auchan, pois o livro em causa, tal como o seu autor, são sinónimo de sucesso de vendas e uma empresa excluir um bom negócio é algo que os accionistas não costumam apreciar. Ainda para mais em tempos de crise.a O embargo. Há um país que se antecipou a todos os outros e sem qualquer hesitação proibiu por tempo indeterminado todos os voos de e para o México. Ao fim de 48 horas as autoridades desse país autorizaram excepcionalmente alguns voos para que os mexicanos pudessem regressar ao seu país. Falo de Cuba naturalmente e das medidas que aí foram tomadas para combater a gripe suína, mexicana, A ou o que lhe quiserem chamar. O regime dos irmãos Castro goza certamente da melhor imprensa do mundo, pois não só este fecho de fronteira ou embargo passou praticamente incógnito, como por ironia foi decidido poucos dias antes das celebrações do 1º de Maio naquela ilha, onde o tema dominante dos discursos foi, como é hábito há décadas, a contestação ao embargo norte--americano. Não deixa de ser paradoxal que, apresentando-se o regime cubano como contrário ao capitalismo, apresente como a única e obsessiva razão do seu falhanço o facto de não ter relações comerciais com os EUA. Sendo certo que Cuba mantém essas relações com todo o restante mundo, onde aliás compra 80 por cento dos alimentos consumidos na ilha. Outra constante desta data em Cuba é a presença de delegações que representam sindicatos do restante mundo, nomeadamente de países europeus. De Portugal apenas encontrei o rasto a Armanda Fonseca, que preside à Associação de Amizade Portugal-Cuba e que, como não podia deixar de ser, defendeu o fim do embargo norte-americano. Do embargo de Cuba ao México nem uma palavra, mas valha a verdade que em Cuba também ninguém lhe deve ter perguntado o que pensava sobre tal assunto. O que contudo aqui na pátria poderíamos aproveitar com esta viagem a Havana da presidente da Associação de Amizade Portugal-Cuba era sermos elucidados sobre como reagiram os trabalhadores cubanos às declarações de Salvador Valdés Mesa, presidente da única central sindical do país, que lhes disse que tinham de ser mais disciplinados, trabalhar mais e poupar mais. E para quê tudo isto? Para viverem melhor? Terem mais direitos? Não. Muito prosaicamente para construírem o socialismo "sob a direcção do Partido Comunista de Cuba, de Fidel e Raúl". Aplique-se esta frase a Portugal, Espanha, França etc. e talvez se torne mais óbvio o reino cadaveroso que dá pelo nome de Cuba socialista. a Não digam que não avisei. A associação Juntos pela Vida enviou uma carta aos autarcas das cidades que proibiram as touradas pedindo--lhes que também proíbam, nos seus concelhos, estabelecimentos onde se pratiquem abortos. Rapidamente o presidente da Associação Animal veio dizer que "este apelo é absurdo" e que a dita associação está a fazer uma "confusão tremenda de poderes". Infelizmente a Juntos pela Vida não está a confundir nada. Acontece simplesmente que o voluntarismo dos autarcas no caso das touradas, a par do proselitismo dos ditos amigos dos animais, criou um precedente gravíssimo em matéria de licenciamento. Pode ou não um autarca não licenciar uma actividade legal no país? Dado o absurdo da questão e sobretudo porque estão autárquicas à porta, rapidamente se tem tentado transformar o que começou por ser apresentado como uma proibição num "não apoio" por parte das autarquias. O caso é particularmente sensível em Sintra onde o regulamento que impede as touradas nasceu sob os auspícios do BE. Ora, o BE percebeu tarde mas percebeu que o sucedido em Sintra o pode levar a perder a sua única autarquia, por sinal a muito tauromáquica Salvaterra de Magos. Da exultação inicial com a proibição das touradas, o BE passou, pela pena do próprio Louçã, o que denota a preocupação que o assunto suscita naqueles lados, para a explicação de que o regulamento de Sintra apenas impede o apoio municipal. Esquece Louçã que o tipo de tourada que existia em Sintra exige licenciamento municipal, pois o concelho de Sintra era dos raros senão o único que no continente tinha tourada à corda. Sem querer arranjar uma quezília entre o lobby dos antropólogos do BE e Louçã, ainda acrescento que a mesma tourada era descrita como o que sobrava de uma antiga celebração de características pagãs inserida numa festa religiosa católica.

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