terça-feira, 4 de novembro de 2008

O lider americano de que precisamos

Excelente artigo de opinião de Chris Patten
O líder americano de que precisamos
04.11.2008,
Chris Patten

A campanha presidencial para as eleições norte-americanas atraiu, por todo o mundo, muito mais atenção do que a política interna de cada um dos nossos países. O interesse nas eleições é o melhor exemplo do soft power da América, e uma lição de democracia da única superpotência mundial. O que quer o mundo - e, talvez mais importante, o que é que o mundo precisa - do novo Presidente? Muitos odiarão admiti-lo, porque o antiamericanismo foi um sentimento alimentado durante os anos da Administração Bush, mas hoje o mundo precisa de uma liderança americana.Sim, estamos a testemunhar a emergência da China, Brasil e Índia como importantes actores na economia global. Sim, temos visto a queda humilhante dos senhores de Wall Street. Sim, as proezas militares americanas esvaziaram-se naquilo a que Winston Churchill chamou "os ingratos desertos da Mesopotâmia", e a sua autoridade moral foi enfraquecida por Guantánamo ou Abu Ghraib.Tudo isto é verdade. Os Estado Unidos continuam a ser a única superpotência mundial, o único país que interessa em qualquer parte do mundo, o único capaz de mobilizar uma acção internacional para travar problemas globais. A primeira tarefa do novo Presidente será restabelecer a competitividade económica e a autoconfiança da América. Não será fácil governar um país com excesso de gastos e de empréstimos, restabelecer os valores de poupança e responsabilidade. Alcançar esses objectivos implica uma grande atenção às questões de igualdade social, após um período em que os muito ricos puderam proteger o estilo de vida dos vibrantes anos 20 , explorando as "guerras culturais", ou seja, os preconceitos populistas dos cidadãos mais pobres.Com a América a afastar-se do seu papel global de emprestador de último recurso, o resto do mundo vai precisar de aguçar o nível de competitividade para vender em outros mercados. O que é imperativo é que isso não pode ser impedido por um retorno do proteccionismo. O novo Presidente deve lembrar as consequências desastrosas dos anos 20 e 30. Os falhanços do Presidente Herbert Hoover devem ser uma lição penosa.Todos olhamos para o novo Presidente como alguém que irá envolver-se na comunidade mundial e nas organizações internacionais e aceitar que mesmo uma superpotência deve acatar as regras que pede para os outros. A ONU está longe de ser perfeita. Precisa de reforma - bem como os organismos que possibilitam uma governação económica global. Isso vai levar tempo. Mas condição necessária para a mudança é que a América se empenhe e lidere esse processo. Esqueçam o diletantismo de tentar criar uma alternativa à ONU - a chamada "Liga das Democracias". Não funciona.Queremos um novo Presidente que queira fazer da Conferência para a Renovação do Tratado de Não-Proliferação Nuclear, em 2010, um sucesso, o que implica desmantelar mais armas e abandonar a investigação sobre elas, ao mesmo tempo que desafia os outros a fazer o mesmo. Esse será o melhor pano de fundo para estabelecer uma observação e monitorização mais rígidas: começar a dialogar com o Irão e procurar envolver a Índia e o Paquistão num acordo nuclear.Acima de tudo, um novo Presidente deve soltar o potencial criativo da América na área da eficiência energética e do desenvolvimento de tecnologias limpas. Poderá ser uma surpresa bem-vinda, se no próximo ano houver acordo em relação à actualização do Protocolo de Quioto. Mas pelo menos devemos esperar chegar a acordo quanto ao processo que irá pôr a discussão no sentido correcto e, como parte disso, a América deve envolver a Europa, a China e a Índia, em particular, nos desenvolvimentos tecnológicos como o carvão limpo.A relação da América com a China será fundamental para a prosperidade e segurança neste novo século. Não penso que a luta pela hegemonia seja inevitável, ou que possa ser desejável. Os EUA devem prestar mais atenção à China sem nunca pretender que as questões de direitos humanos sejam varridas para debaixo do tapete. A China não pode manter o seu desenvolvimento económico sem mudanças políticas e melhorias ambientais.O primeiro-ministro israelita, Ehud Olmert, deixou, antes de sair, alguns conselhos ao próximo Presidente americano. Israel e Palestina tornaram-se, disse, o desesperante e sangrento prisma através do qual a diplomacia americana muitas vezes vê o mundo. É tempo de arranjar uma saída sustentável para os colonatos que quase foi conseguida na era Clinton.Durante anos pediu-se uma abordagem multilateral de Washington. Quando tivermos uma, o resto do mundo - a Europa, por exemplo - responderá com suficiente empenho? Será um desafio bem-vindo pôr os nossos esforços naquilo que andámos a dizer.Chris Patten é um ex- comissário europeu para as Relações Externas e foi o último governador britânico de Hong Kong. É chanceler da Universidade de Oxford e membro da Câmara dos Lordes

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