terça-feira, 24 de março de 2009

Não há mais mundo para além de Lucílio Baptista?

Excelente editorial do JMFernandes no Público de hoje...
Basta. Para o ano há mais. Mas até lá era bom resolver problemas como o da escolha do provedor de Justiça e saber como pôde o Gerês arder com tanta facilidade em... Março. Desde sábado que o erro de um árbitro de futebol parece ser o único problema de Portugal e do mundo. Parece consensual que o árbitro errou e favoreceu uma das equipas. Estava em jogo o menos importante troféu português - mas quem o disputava eram o Benfica e o Sporting. Não chega para praticamente abafar toda a restante actualidade, ou então estamos perante a vingança póstuma de Salazar, que acreditava poder anestesiar o país a doses de Eusébio. Adiante pois.
O debate sobre a substituição do provedor de Justiça já passou dos limites. E com a colaboração da comunicação social.O lugar não é menor no nosso sistema democrático. Graças à moldura constitucional do cargo e aos provedores que tivemos, trata-se de um serviço que tem sido prestado ao cidadão e por inúmeras vezes limitou os estragos dos muitos abusos do Estado. Para além de que o seu titular faz parte do Conselho de Estado.Como em muitos outros lugares de nomeação parlamentar que exigem maioria de dois terços, a escolha do provedor de Justiça tem passado por acordos entre o PS e o PSD. Não tem obrigatoriamente de ser assim, mas é difícil conseguir uma maioria para o eleger sem o acordo dos dois partidos. Infelizmente, nos últimos anos estes dois partidos não têm estado à altura do que se lhes exige, sendo que a principal responsabilidade tem sido do maior partido, o PS, que, apesar da larga vantagem que leva no número de designados, tem querido mudar sistematicamente as regras do jogo de forma a proteger a sua maioria absoluta.Num sistema democrático e aberto devem existir poderes independentes que equilibrem e fiscalizem os poderes executivos. Em Portugal, um desses poderes é o de provedor de Justiça. Outro é o de presidente do Conselho Económico e Social. Como é difícil fazer coincidir os seus mandatos com os dos governos (nem isso devia acontecer), o entendimento é que o PSD escolhe um (tem sido o provedor de Justiça) e o PS o outro. Foi aqui que começou a ruptura. E este é o ponto central, já que depois aquilo a que assistimos tem sido sobretudo chicana política. Para mais indecorosa, mas fácil de entender: o PSD propôs um nome, o PS não respondeu e começou a lançar nomes para a imprensa (Freitas do Amaral, Rui Alarcão, António Arnaut). Quando a pressão aumentou atirou com um nome que, ao contrário de qualquer dos anteriores, poderia ser aceite pelo PSD: Jorge Miranda. O qual, contudo, de acordo com o PS, só aceita ser eleito com o apoio dos dois partidos. O PSD não cedeu, até porque ainda esperava por uma resposta do PS ao seu nome.Resultado: como Jorge Miranda é "irrecusável", o foco da discussão passa a ser saber se existe ou não uma birra de Manuela Ferreira Leite ou se o que está em causa é a forma como se escolhem os titulares de importantes lugares públicos. Está bem de ver que a maioria dos comentadores já só fala de nomes, o resto deixou de interessar. A politiquice parece estar a levar a sua avante.
Custa a perceber como a serra do Gerês voltou a arder com tanta facilidade quando ainda estamos em Março. Quando não está muito calor. Quando na mais antiga área natural protegida do país já existiram quadros e meios para evitar fogos com as dimensões do que eclodiu na manhã de domingo.Perderam-se árvores centenárias e muito raras, apesar de as chamas não terem atingido o coração da zona mais preciosa, a Mata da Albergaria, um tesouro nacional. Mas perdeu-se demasiado pouco tempo para dizer que o fogo tinha origem humana - isto é, que era um fogo posto. Curiosamente, essa queixa surgiu depois de um secretário de Estado se ter junto aos que, no terreno, comandavam as operações. O que se passou foi demasiado grave para ficar esquecido: exige-se um inquérito à forma como está a ser gerida aquela área protegida, à forma como foi dirigido o combate ao fogo e à forma como o Estado, que é dono da maior parte daqueles terrenos, tem ou não procedido à limpeza das matas que recomenda aos proprietários privados.

Sem comentários: